No tempo em que o mundo começava no portão do pátio e terminava no cajueiro do fundo da rua, os dias corriam longos e mornos, e o tempo parecia não ter fim. A nuvem anual de gafanhotos cobria o céu durante um dia inteiro e sabíamos que estava a começar o estio. O chão passava de castanho a amarelo, e os pés, descalços ou vestidos de chinelos, ficavam secos e pele entre os dedos gretava. Nesses dias escondíamo-nos do sol nos ramos da árvore mais alta, os mais crescidos a empurrarem os pequenos e os mais fortes a estenderem mãos e braços para não deixar ninguém prisioneiro do rio de pó. Sentados, na ramada que ainda persistia, decorávamos, ou aprendíamos palavras estranhas, o nome dos pássaros e rimas e risos. Naquele tempo não sabíamos que o mundo era maior que fim da rua, e que além do mata, para lá da serra, na terra plana e seca onde corriam as pála-pála, havia gente igual a nós.